domingo, 29 de outubro de 2017

Vamos lutar pelo que de fato está destruindo nossa sociedade!

“Erradicar um tabu é mais difícil que adquirir um hábito.” Jeferson Calixto

Assim como todas as novelas da autora Glória Perez, a novela A Força do Querer tinha o objetivo de tratar sobre "diversidade, de tolerância, das dificuldades de compreender e aceitar o que é diferente de nós"¹ o que causou grande polêmica, principalmente nas redes sociais. A trama mais importante da novela girava em torno da história, baseada em fatos reais, de personagens envolvidos com o trafico de drogas e violência em uma favela fictícia. Além dessa, também havia outro trama muito polêmica que contava a história de um homem transsexual, que inicia a novela como menina e vai sofrendo sua transição no desenrolar dos episódios. Houve grande reprovação do grupo de cidadãos brasileiros que se dizem "guardiões da família" e surgiram apelos para um boicote em massa, demonstrando, assim, a insatisfação da nação "de bem".

Concordo que a televisão tem usado de muito apelo sexual e violento para prender o grande público, e que isso não é bom para as crianças e adolescentes que se utiliza desse meio de comunicação para o entretenimento, mas o que me chama a atenção é o que se torna gatilho para as mobilizações de reprovação. Se as novelas, filmes ou movimentos artísticos em seus conteúdos apresenta características de desigualdade social, racismo, violência ou erotização, a sociedade da "moral e bons costumes" não grita, não se incomoda, não reclama; mas quando o assunto aborda através de seus personagens assuntos como sexualidade ou quebra dos papéis de gênero, a bíblia sai das estantes e começa uma caminhada em prol a moralidade.

Vi diversos debates onde populares diziam que quem apoia a discussão sobre assuntos envolvendo sexualidade e gênero é pervertido, comunista (???) entre outros adjetivos. Não se fala seriamente sobre esses assuntos nas casas e nas escolas, tudo é tratado por "pinceladas" e os dias vão passando e a vida também. O discurso de quem se opõe a esses temas é que todo mundo vai virar gay, lésbica ou afins, e assim a humanidade se perderá na promiscuidade (como se o fato de ser homossexual significasse ser promiscuo). Concordo que as crianças são muito influenciáveis, mas a sociedade tem se focado no tema errado.

Em minha rotina em sala de aula vinha percebendo a mudança de comportamento dos meus alunos que concomitava com o desenrolar da novela, tanto dos meninos quanto das meninas. Como eles seguiam a novela com seus responsáveis, eles acompanharam a trama até o final e eu sofrendo com as atitudes que foram tomando por conta da influência dos personagens. Eles sabem me contar o resumo de toda a trama, mas não conseguem realizar uma produção de texto fazendo um resumo de qualquer outra coisa; eles criam um roteiro para brincadeira inspirados nos personagens, mas não se interessam em fazer alguma apresentação proposta por mim.

E eu lhes pergunto: quais personagens e enredos mais interessam essas crianças? Os personagens homo ou transexuais com suas relações amorosas? NÃO!!!! Meus alunos são o Rubinho, o Sabiá e a Bibi, seus recortes e jogos de montar agora viram armas, o linguajar das crianças mudou e ganhou palavrões e gírias faladas por esses personagens, nos momentos livres e recreio ficam brincando de "bandido" e a brincadeira ficou mais violenta provocando momentos de tensão quando alguém se machuca.

Parece que os pais não se dão conta da gravidade da situação, quando relatamos o comportamento agressivo ou desrespeitoso das crianças, ouvimos a célebre frase: "mas em casa ele não faz isso", ou eles não percebem ou estão banalizando as atitudes de seus filhos.

Será que o foco da mobilização social deve ser mesmo no se trata de sexualidade? Será que discutir sobre os papéis de gênero e suas mazelas é o que vai destruir a sociedade? Porque não abrimos os nossos olhos e deixamos nosso moralismo de lado e cuidamos de fato de nossos filhos e crianças que amamos? Porque mantemos o silêncio velado e torcemos para que nenhum mal atinja os nossos, em vez de conversarmos sem reservas a fim de proteger a quem amamos?

Ficam as perguntas para reflexão.

¹http://gshow.globo.com/tv/noticia/2016/12/nova-novela-das-9-conheca-trama-e-os-personagens-de-forca-do-querer.html

segunda-feira, 23 de outubro de 2017

O menino está na fila "errada", e agora?

Atualmente a sociedade brasileira está muito preocupada com o fato de que os papéis de gênero, já estabelecidos há séculos, estão sob desconstrução, e isso causa um desconforto geral, já que abala as "estruturas" de quem, até então, tinha o controle social. Esses debates giram em torno do comportamento sexual ou do papel de gênero que um indivíduo desempenha sem que se leve em consideração aquele ser como um humano. Essas pessoas que são condenadas ao inferno, acusadas de escolherem sua sexualidade erroneamente e impedidas, muitas vezes, de viver seus direitos como cidadãos, são nossos colegas de trabalho, nossos familiares, nossos filhos, nossos alunos.

Outro dia, na escola em que leciono, vivi uma experiência e gostaria de dividi-las com vocês.

Na festa das crianças a escola foi presenteada com alguns brinquedos para a garotada, estavam todos animados e as crianças formaram uma fila enorme para brincar no que era a sensação da festa - "o futebol de sabão". O rapaz que estava responsável pelo brinquedo organizou as crianças em duas filas distintas, uma de meninas e outra de meninos com a justificativa de evitar "problemas" por conta das "brincadeiras mais bruscas dos meninos".

Após alguns minutos percebi que havia um garoto (de 9 anos) na fila das meninas conversando animadamente com suas colegas de turma. Me aproximei e perguntei educadamente e bem baixinho: "amiguinho, você vai brincar?" Ele acenou positivamente e eu continuei: "então, você percebeu que está na fila para as meninas e que tem uma fila só para os meninos?". Ele, com um olhar meio desapontado me respondeu: "eu sei tia, mas eu não quero ir com os meninos não!". Percebi o desconforto do menino, mas preocupada com a frustração que ele poderia vivenciar por chegar ao final daquela longa espera e ser impedido de brincar por estar na fila "errada" eu continuei: "amor, então, eu entendo, mas acho melhor você ir pra fila dos meninos, se não, o moço não vai deixar você brincar". O garotinho, concordou comigo e com cara de choro foi pra fila masculina, ficou ali isolado e desconfortável, esperou exaustivamente e quando finalmente chegou a sua vez ficou pulando sozinho no brinquedo, sem interagir com os meninos que estavam jogando futebol.

Confesso que fiquei muito desapontada por não ter lidado com aquela situação corretamente, tentei ser carinhosa e não causar maiores frustrações - na verdade fiquei com medo dele sofrer um constrangimento maior - mas minha boa vontade não ajudou muito. O menino não aproveitou o brinquedo e ficou frustrado.

A gente não trata esses assuntos com seriedade, fazemos piada, rimos e mudamos de assunto, mas nossas crianças sofrem com nossa recusa de aprender a lidar com a diversidade. Já presenciei diversas situações em que a professora ou responsável constrangeu a criança repreendendo-a, publicamente, por sua atitude não condizer com que era esperado para seu sexo, e em todas essas situações a criança chorou, sofreu e ninguém parou pra pensar se estavam fazendo mais mal do que bem para esse ser em construção.

Independente de nossas crenças ou valores nossas crianças gays, trans ou que simplesmente não seguem os padrões existem e sofrem diariamente por conta de nossa incapacidade de nos colocarmos em seus lugares.

Será que estamos agindo corretamente? Vamos refletir sobre isso, por favor!
Sejamos mais humanos.

Por Priscila Messias

sábado, 14 de outubro de 2017

O colorismo nosso de cada dia.

Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele, por sua origem ou ainda por sua religião. Para odiar, as pessoas precisam aprender, e se podem aprender a odiar, elas podem ser ensinadas a amar.
Nelson Mandela

Minha pele não é tão escura, mas o sangue que corre em minhas veias é preto. Apesar de hoje fazer parte (sendo uma pseudo-ativista) de um forte movimento de empoderamento negro, não sofro das mazelas do preconceito racial como muitos dos meus irmãos de pele mais pigmentada. Ser negro num país como o Brasil não é tão fácil quanto parece ser, apesar de mais da metade da população brasileira se declarar de origem afro-descendente, o preconceito racial é muito forte, ainda mais quando atrelado ao preconceito social.

Porque minha pele é mais clara vivo alguns privilégios em relação aos meus irmãos: não tenho sobre mim olhos desconfiados quando entro em uma loja, não sou mal tratada nos locais públicos, não sofri de violência obstétrica, nunca desconfiaram que meus filhos não fossem meus, e nunca fui chamada de macaca ou negra fedida. Mas já vi tudo isso acontecer, e muitas vezes eu fiz parte do grupo que proferia palavras racistas em relação ao outro, preciso admitir. Meus irmãos que têm mais melanina em sua genética já enfrentaram ou ainda enfrentam situações surreais, em geral são tratados com desconfiança e descredibilidade por conta de sua cor.

Não é porque não tenha sofrido esse tipo de preconceito que eu deva ignorar sua existência, o racismo existe e ele ceifa vidas, tira oportunidades e destrói sonhos. O preconceito racial é cruel e tem o poder de destruição imensurável, tal que é capaz de destruir um povo inteiro.

Somos capazes de virar esse jogo e acabar de vez com as injustiças provocadas pelo racismo ou qualquer outro tipo de preconceito: social, de gênero, racial, religioso. Mas para isso é preciso a desconstrução de tudo que ouvimos o aprendemos e estar aberto aos novos conhecimentos. O Brasil precisa ver seu povo de pele negra e sangue crioulo com respeito e dignidade.

Sonho com o dia que isso irá acontecer, vem sonhar comigo também!
Um abraço a tod@s...
Por Priscila Messias

domingo, 13 de agosto de 2017

#NenhumaAMenos!...sobre feminicídio

Pela memória de Mayara Amaral e tantas outras que morrem a cada minuto nesse planeta.

Marcela Lagarde, antropóloga e feminista mexicana, utiliza a categoria feminicídio, que significa assassinato de mulheres (termo homólogo ao homicídio), mas acrescentando a ele uma significação política: a de genocídio contra as mulheres¹

Dizem por ai que nós feministas somos cheias de mimimi, que reclamamos por qualquer coisas, que nos vitimizamos em tudo. É triste, mas ouvimos isso com frequência até da boca de mulheres que não entendem o que é e o porquê dos movimentos feministas. Somos muito mal compreendidas porque as pessoas que nos criticam não se dispõem a tentar entender os nossos motivos, ou ao menos aceitam que as mudanças sociais, em favor da mulher, ocorridas ao longo da história é consequência da luta do feminismo.

Vivemos tempos sombrios em que a violência é resposta para tudo, e quem é mais vulnerável acaba por sofrer nas mãos daqueles que se sentem os seus "donos" ou se colocam como "seres superiores". Nossa sociedade sempre sofreu com esse tipo de comportamento em relação às mulheres, crianças, negros, LGBTs e outros, a diferença é que cada vez mais deixamos bem claro que não aceitaremos qualquer tipo de comportamento ultrajante contra as mulheres e não nos calaremos. O nosso barulho gera muito incômodo, mas ele precisa ser feito.

Milhares de mulheres são mortas a cada minuto por esse mundo, muitos desses assassinatos são cometidos por homens muito próximos a elas, são seus esposos, namorados, pais e amigos. E elas só são mortas porque a sociedade entende que somos inferiores e temos que aceitar a nossa sorte, seja ela qual for.

Ainda hoje as mulheres são espancadas, violentadas, assassinadas e acusadas de serem as causadoras desses atos porque, de alguma forma, provocam seus agressores até que eles se tornem seres irracionais ao ponto de lhes fazerem o mal, apesar de hoje termos umas as outras, para muitas a única alternativa ainda é o silêncio, pois não sabem a quem recorrer, já que toda a sociedade as recrimina e se recusa a defendê-las.

Somos seres que pensam, que fazem uso da capacidade de gerir conflitos, então por que ainda vimos em nossos jornais o termo "crime passional" (movido a paixão) para justificar um assassinato ou violência de qualquer natureza? Por que ainda temos homens que continuam sua vida mesmo após destruir a vida de uma mulher? Por que a sociedade penaliza a mulher e não aquele que lhe tira a vida?

Não dá pra entender porque numa sociedade em que os seres humanos deveriam ser analisados por conta de suas capacidades, nos catalogamos de acordo com o gênero, sexualidade, credo ou cor. Enquanto não entendermos que devemos lutar pelo coletivo, precisaremos de pessoas com garra para gritar aos quatro cantos as lamentações daqueles que já não podem lutar por sua sobrevivência.

Como feministas gritamos e choramos por nossas irmãs, algumas não têm a sorte de sobreviver ou se livrar de seu sofrimento, mas continuaremos lutando até que estejamos seguras e não precisemos mais sofrer com a morte de mais uma de nós.

Um abraço a tod@s,
Por Priscila Messias
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¹(https://pt.wikipedia.org/wiki/Feminic%C3%ADdio)

quarta-feira, 26 de julho de 2017

Só a minha fé salva?

"As religiões são caminhos diferentes convergindo para o mesmo ponto. Que importância faz se seguimos por caminhos diferentes, desde que alcancemos o mesmo objetivo?" Mahatma Gandhi

Já falei sobre isso em outra postagem, mas é um assunto que dá muito "pano pra manga" e vale a pena retomar a discussão. Bom, vamos lá ...

Outro dia enquanto assistia a um filme desses de drama familiar, me deparei com o proselitismo (é a ação ou empenho de tentar converter uma ou várias pessoas em prol de determinada causa, doutrina, ideologia ou religião.¹) que anda embutido em diversos filmes desse gênero, tentando convencer a todos que basta ter fé em Deus, especificamente dentro do protestantismo, para que tudo dê certo. E vale ressaltar que quem professa outra ou nenhuma fé, aparece no papel de pessoa rude e ignorante que, por conta de alguma tragédia se volta para a fé cristã no final do longa e se torna um ser lindo e sereno.

Não tenho a intenção de desmerecer o papel do cristianismo para a formação, acalento e redenção do ser humano (até porque faço parte desse grupo, pois só sou quem sou por conta da minha formação cristã), mas questionar se realmente essa é a única fé ou religião válida para que alcancemos o divino. Será mesmo que só o protestantismo "toca o coração de Deus" (termo entoado nos cânticos dominicais)? Será que aquela outra religião, por mim, desconhecida é proveniente do maligno?

Tenho meus dogmas e pragmatismos, mas não desconsidero os dogmas alheios, pois se buscarmos um pouquinho mais de informação podemos perceber que falamos das mesmas coisas mas com uma linguagem diferente. O que vale sempre é a FÉ, acreditar numa divindade que faz com que nossas experiências sobrenaturais inexplicáveis sejam caracterizadas como milagres ou sensações espirituais. Portanto, se preciso da fé para que minha religião seja real, o que me difere do outro que professa algo diferente de mim?

Sim! Precisamos discutir religião, sem tentar impor que a nossa é a única que nos levará para um ótimo patamar no post mortem, mas com o objetivo de tentar entender como funciona e o que rege cada uma. Nós nem nos dispomos a questionar, duvidar ou conhecer novos dogmas, pois somos doutrinados a não contestar sobre questões divinas, a única fé válida é a fé Cristã, outras formas de buscar o divino são um campo proibido, intocável, obscuro. Somos levados a pensar que tudo aquilo que difere do que nossos líderes religiosos pregam provêm do maligno. Aprendemos desde muito jovens que não devemos discutir religião, porque para a maioria a discussão remete a briga e não ao diálogo e conhecimento.

Entendo que a fé não deveria ser um passaporte para sei lá onde, mas um estilo de vida que nos torne seres humanos melhores a fim de proporcionar, a quem necessita, a perspectiva para uma vida abundante.


Um abraço a tod@s
Por Priscila Messias

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¹https://www.significados.com.br/proselitismo/

domingo, 23 de julho de 2017

Nossos Homões

Eis que surge Rodrigo Hilbert, "homão da porra", homem gato que cozinha, conserta, cuida das crianças e torna público sua admiração por sua esposa; em uma entrevista deixa claro que não vê nenhum heroísmo nisso, mas que é obrigação dele compartilhar dos cuidados da casa e dos filhos com sua mulher. Essa postura é algo incrível ou alguma inovação? NÃO!!!!

Existem diversos cabras machos que fazem o mesmo em suas casas, alguns, inclusive, optaram por não trabalhar "fora" para cuidar dos afazeres domésticos, já que a esposa teria uma carreira mais promissora e manter uma empregada doméstica nos dias atuais não é lá uma coisa barata, esses homens são taxados, injustamente, como vagabundos que são sustentados por mulheres (só nós sabemos o quanto esses caras trabalham, cuidar de casa e filhos não é uma função pra vagabundo não!).

Hoje Rodrigo virou meme de rede social, é odiado por alguns e ovacionado por outros, criticado por homens CIS e até mesmo por algumas feministas, mas ele não faz nada além de seu papel do homem que entende que sua mulher não é sua empregada, gueixa e babá de seus filhos. Esse homem entende que sua mulher é sua parceira.

Agora olhemos ao nosso redor, mais especificamente ao seu lado e veja se seu homem também não é desses "homões da porra". Eles precisam ser melhor observados, quantos deles não chegam cansados de seus compromissos profissionais e ainda preparam um prato delicioso para a família? Ou encontram umas louças na pia e deixa tudo limpinho? Ou ainda, se concentram em dar atenção aos pequenos enquanto a mamãe está atolada com todas as outras coisas?

Pasmem-se, eles existem! Muitos deles estão dispostos a dividir conosco essa carga diária, mas nós mulheres precisamos aprender a aceitar a ajuda do parceiro e até ensiná-los, já que a sociedade dita que determinadas funções são exclusivamente femininas. Ninguém nasce sabendo, tudo é aprendido nessa vida, então demos uma chance pra que nesse mundo novos "homões" surjam até que o fato de ser parceiro em todos os aspectos não seja nada extraordinário e inovador.

Que bom se você tiver um "homão da porra", se não, encoraje-o a cumprir esse papel pois as obrigações domésticas é dele também, mas antes de tudo ame-o e valorize o que ele faz assim como você gostaria de ser valorizada.

Por Priscila Messias